A partir do advento das pesquisas experimentais em cognição incorporada, foi possível verificar empiricamente que os processos sensório-motores, quais sejam a orientação e a prontidão do corpo para agir no espaço, condicionam e regulam os modos de conexão dos conteúdos cognitivos, permitindo assim que a mente transcenda o espaço. É desse modo que o pensamento abstrato é inelutavelmente conectado às funções sensório-motoras e, assim, à estrutura espacial das interações do corpo no mundo. Cumpre advertir para a anterioridade das experiências de “ocupação” do espaço — sensório-motoras — em relação às experiências de “conceituação” do espaço — simbólicas. O presente estudo ancora-se à hipótese de que a hegemonia espacial em nosso sistema perceptivo e cognitivo está fundamentada no fato de que o indivíduo retém e prioriza os sentidos espaciais — descartando a formação de outros possíveis tipos de sentidos —, porque a objetividade espacial oferece à memória um desempenho mais rápido e preciso. Ou seja, parece que nossas estratégias cognitivas ao usarmos esquemas espaciais de memória para entender o mundo são processos sistemáticos de redução da complexidade descritiva do ambiente. A hipótese aqui discutida é que para atribuirmos “materialidade” aos objetos musicais e assim construirmos os sentidos incorporados da música, é preciso, antes, reduzirmos a densidade do meio sonoro, possibilitando a apreensão do fluxo musical em modalidades coexistentes e interagentes de coerência configurativa.
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